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Mendes diz que Estado não se preocupa apenas com servidores e que cidadão é o grande patrão

Em entrevista ao jornal Folha de São Paulo publicada nesta quarta-feira (16), o governador de Mato Grosso Mauro Mendes (DEM) voltou a dizer que assumiu um estado 'quebrado', reforçou a necessidade de cortes de gastos e afirmou que o servidor tem sua importância, porém não é o único problema. 

Na entrevista concedida ao repórter Rodrigo Vargas, o chefe do Executivo também defendeu reformas profundas para a solução da crise em todo o país.

Veja abaixo trechos da entrevista:

Quando terminou seu mandato como prefeito de Cuiabá, em 2016, o empresário Mauro Mendes deixou de lado uma reeleição quase certa para, segundo afirmou à época, dar atenção aos negócios. Seu grupo empresarial, que atua principalmente no setor metalúrgico, estava em recuperação judicial, com dívidas de mais de R$ 120 milhões.

A crise nas empresas foi contornada a tempo de Mendes retomar a carreira política na eleição seguinte. Recém-filiado ao DEM, o goiano de 54 anos encabeçou a chapa que venceu a disputa ao governo de Mato Grosso ainda no primeiro turno, com quase 60% dos votos válidos.

No comando do Palácio Paiaguás há pouco mais de 15 dias, Mendes não usou meias palavras para definir a situação financeira que herdou de seu antecessor, o ex-aliado Pedro Taques (PSDB). "Mato Grosso está quebrado, literalmente", afirmou, em entrevista à Folha.

Além de cortes de secretarias, extinção de órgãos estaduais e o escalonamento dos salários do funcionalismo, ele anunciou que pretende combater benefícios que fizeram a folha de pagamento crescer mais de 70% nos últimos quatro anos. "A mulher que serve cafezinho ganha R$ 13 mil", afirmou.

Folha – O PIB de Mato Grosso cresceu 118% entre 2010 e 2016. No ano passado, colheu mais de 25% da produção de grãos do país. Como é possível que este mesmo estado esteja em crise financeira?

Mauro Mendes – Descontrole e falta de gestão de um estado que inchou muito. Apesar de a economia privada ter crescido muito, não tivemos competência para aproveitar esse salto a nosso favor. Em quatro anos, nossa receita cresceu 43%, um dos melhores resultados do Brasil, acima da inflação. Ao mesmo tempo, porém, nossa folha cresceu algo em torno de 75%. Ou seja, a despesa disparou, principalmente aquela com pessoal.

Folha – O senhor tem dito que o estado está quebrado. Isso é apenas uma força de expressão?

Mauro Mendes – Não, é a realidade. Está literalmente quebrado. Um estado que atrasa 13º, que está atrasando folha, que tem todos os seus fornecedores com atrasos de três meses a até um ano, que não paga médicos, hospitais, que não faz repasse aos municípios, não tem outra forma de definir.

Por que a folha de pagamentos se tornou a vilã dos governadores estaduais em todo o país? Eu vou citar um exemplo. Aqui em Mato Grosso, em 2011, nós tínhamos uma servidora de um dos nossos órgãos. Era auxiliar de serviços gerais, servia cafezinho e ganhava R$ 1.300. Em 2018, ela recebeu R$ 13 mil mensais para desempenhar a mesma função. E é justamente isso que aconteceu aqui e provavelmente muitos lugares. 

Folha – Mas como seria possível intervir nisso sem mexer nos direitos adquiridos?

Mauro Mendes – Dentro da esfera estadual, irei encaminhar leis para propor um enxugamento da máquina pública. Aliás, já estamos fazendo isso, reduzindo de 24 para 15 secretarias. Propomos também a extinção de seis empresas públicas, demitir quem for possível demitir e cortar onde for possível cortar. Mas existem as leis federais, às quais todos estamos submetidos. E, se não houver mudanças também nesta esfera, o Brasil também vai quebrar. Ou seja, só tem um jeito: o país precisa entender que não existe milagre. Dinheiro público não brota em árvore. Ele vem do bolso do contribuinte. Ou nós mudamos essa realidade, ou o contribuinte, o cidadão brasileiro, vai pagar cada vez mais pela ineficiência do poder público.

Folha – O ex-governador Pedro Taques tinha uma relação conturbada com o funcionalismo estadual. Em seu mandato ocorreu a maior greve da história. Em meio à crise, como pretende evitar que o mesmo ocorra em seu governo?

Mauro Mendes – Temos que dialogar sempre. Quem está no serviço público tem obrigação de dar satisfação ao público. Agora, o Estado não existe somente para seus servidores. Eles são importantes e têm que ser respeitados, mas existe um grande patrão, que é o cidadão. E temos que ver se esse patrão está disposto a ver sua carga tributária sendo aumentada cada vez mais para bancar um serviço público que não dá respostas à altura. Nossa economia é forte e pujante, mas a ineficiência pública está arrastando o país para o fundo do poço. Ou a gente muda isso, ou todos iremos perder, incluindo aí o próprio servidor.

Folha – Um levantamento do Tribunal de Contas do Estado apontou que parte do descontrole se deve a leis que definiram diversas carreiras do serviço público no final de 2014. O senhor pretende alterá-las?

Mauro Mendes – Temos condição de pagar o que está previsto? Temos condição de pagar R$ 1 bilhão a mais em salários para a educação? Se isso acontecer, como está previsto, o cidadão fique consciente: vou ter que dobrar o ICMS da energia elétrica e aumentar o dos combustíveis para pagar o aumento previsto para algumas categorias. Não dá mais para fazer um jogo de faz de conta.

Folha – Viaturas da polícia e ambulâncias do Samu estão paradas por calote nos contratos de locação. Considerando que ajustes fiscais não dão resultados imediatos, como pretende manter os serviços essenciais?

Mauro Mendes – Esse é o resultado de prestações que não são pagas há meses. E que não foram pagas porque o governo anterior não tinha dinheiro. Só o Samu tem seis meses de atraso. As locadoras das viaturas estão com quatro a cinco meses sem pagamento. Nós estamos há pouco mais de 15 dias no governo. E não temos dinheiro em caixa. Estamos juntando dinheiro para pagar folha e para pagar o 13º, que está atrasado. Então existe uma duríssima realidade. O que fazer então? Todos precisam colaborar. Os servidores precisam parar e se dar conta de que hoje já temos bons salários em Mato Grosso. Os salários de algumas categorias estão entre os melhores do país. Os poderes precisam se contentar com o que têm e dar a sua contribuição. E o cidadão, o agronegócio, a indústria, também terão que contribuir. Se todo mundo ficar no seu quadrado, achando que o problema é dos outros, o Estado afunda e leva todo mundo junto.

Folha – Uma proposta que vem ganhando força para amenizar a crise nas finanças do estado é a taxação do agronegócio. O senhor acredita que este possa ser o caminho?

Mauro Mendes – Mato Grosso é um grande exportador e a exportação de commodities é desonerada. Isso ajuda o Brasil na balança comercial, mas prejudica o estado. Mudar a Lei Kandir [que estabeleceu a desoneração de produtos de exportação como a soja] não depende de mim como governador, mas pretendo cobrar da bancada federal e fazer incursões a Brasília, pleiteando e defendendo essa ideia, que é justa e legítima.

Folha – Em um cenário como este, como resolver a questão da obra inacabada do Veículo Leve sobre Trilhos (VLT)?

Mauro Mendes – Eu disse durante a campanha que precisaria de um tempo, pois tinha noção da dificuldade financeira. Como vamos gastar R$ 1 bilhão, segundo a estimativa do governo anterior, para concluir essa obra, se não temos dinheiro para pagar o médico que está trabalhando no pronto-socorro, salvando vidas? Se não temos dinheiro para pagar salário em dia? Não temos sequer capacidade de buscar financiamento. Isso é a verdade. Além do VLT, temos outras 500 obras paradas, a maioria por falta de pagamento aos fornecedores. Temos primeiro que reequilibrar as contas para, no futuro, retomar nossa capacidade de investimento.

Folha – Sobre a política nacional, como analisa o cenário que levou à eleição de Jair Bolsonaro? 

Mauro Mendes – Vejo que houve uma fadiga do tecido político que se apresentou ao longo dessas últimas décadas no Brasil. E ambos os lados que polarizaram essa disputa, com todo o respeito, não foram capazes de apresentar um projeto de Brasil que fosse sustentável para médio e longo prazos. Então o eleitor fez uma aposta diferente e que todos temos que torcer para que produza resultado. Do contrário, eu vejo um triste cenário para este país, pior até do que o registrado em alguns países da Europa recentemente.

Folha – Que tipo de medidas espera ver implementadas?

Mauro Mendes – Reformas. Profundas, verdadeiras e não paliativas. Já estamos devendo mais de 80% do PIB, nosso déficit anual cresce e o país caminha a passos largos para quebrar, inevitavelmente. Não podemos ficar tomando remédio simples para tentar curar um câncer.

Folha – Nos primeiros dias de governo, Bolsonaro transferiu a demarcação de terras indígenas para o Ministério da Agricultura e anunciou mudanças na política ambiental. Como governador de um estado que 43 etnias e três biomas distintos, como pretende tratar estes temas?

Mauro Mendes – Mato Grosso tem hoje mais de 60% do seu território protegido por reservas indígenas, áreas de preservação permanente e reservas legais. Nós somos a região do planeta que mais preserva e, ao mesmo tempo, mais produz alimentos. Posso afirmar que farei grande resistência à criação de novas reservas ambientais, porque muitas foram criadas e jamais legalizadas. O Estado não pode mais continuar com esse nível de irresponsabilidade: baixa uma lei, desapropria uma área para fazer reserva, não indeniza os seus proprietários, cria um passivo jurídico monstruoso para o futuro e inviabiliza o crescimento da nossa produção. Nós temos que entender qual é o jogo que está sendo jogado no cenário internacional. Tem países que vem para cá e financiam suas ONGs, ficam ditando regras para o nosso país e, quando nós os visitamos, eles fazem 100% diferente daquilo que exigem que façamos aqui. Na verdade, alguns deles querem tirar a grande competitividade que temos no setor primário.

 

Fonte: Olhar Direto

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