O encerramento da situação de Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional (Espin) em decorrência da Covid-19 entra em vigor neste domingo (22/5). Com o fim da medida, gestores estaduais e organizações de saúde alertam para um cenário de risco nos próximos meses, devido à estagnação da cobertura vacinal.
A revogação da medida foi assinada pelo ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, há um mês. De acordo com o texto, o encerramento entraria em vigor 30 dias após a publicação no Diário Oficial da União (DOU).
O Ministério da Saúde decidiu que o período seria utilizado para que estados e municípios se adaptassem às centenas de leis que foram publicadas com base na Espin ao longo dos últimos dois anos de pandemia.
Ao Metrópoles o presidente do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), Nésio Fernandes, explicou que a orientação do órgão aos estados foi de adaptar as normas e leis considerando a situação de emergência sanitária internacional, imposta pela Organização Mundial de Saúde (OMS).
Antes da revogação da Espin, o conselho chegou a pedir que a medida entrasse em vigor só após 90 dias, para analisar se a redução de casos e óbitos seguiria em queda. O Ministério da Saúde não aceitou a proposta.
“Alertamos o Ministério da Saúde, apontamos em debates na Comissão Intergestores Tripartite (CIT) que era necessário um período maior para avaliar se a tendência de queda seguiria e quais medidas seriam necessárias. O que vimos nesse período foi uma estabilização da média móvel em torno de um óbito a cada 12 ou 13 minutos pela Covid. Isso não representa um cenário de tranquilidade, apresenta um cenário de risco”, pontua Nésio, que, além de presidir o Conass, é médico e secretário de Saúde do Espírito Santo.
Aumento de casos e vacinação estagnada
De acordo com o boletim Infogripe, divulgado pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) na sexta-feira (20/5), os registros de Covid-19 voltaram a predominar entre as ocorrências de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG). Atualmente, as infecções causadas pelo coronavírus correspondem a 41,8% dos casos analisados pela fundação.
Os índices de vacinação também preocupam: boletim divulgado pelo Observatório Covid da Fiocruz nesta semana aponta estagnação da cobertura vacinal.
Apenas 32% das crianças de 5 a 11 anos de idade estão com o esquema vacinal completo, mesmo que a campanha de imunização infantil tenha sido iniciada há cerca de cinco meses. Nos grupos mais jovens, a cobertura com a terceira dose também segue abaixo da média considerada satisfatória. Entre os mais jovens, de 18 e 19 anos, apenas 25,2% tomaram a terceira dose.
Segundo o pesquisador Raphael Guimarães, do Observatório Covid-19 Fiocruz, os índices de vacinação infantil e de reforço ainda não estão de acordo com as recomendações das autoridades internacionais de saúde. “Hoje, os estudos internacionais recomendam que, para garantir que haja um bloqueio de circulação de vírus, a cobertura vacinal completa deverá alcançar patamares superiores a 90%. O Brasil não chegou ainda aos 80%, de forma que é essencial alavancar esse número”, ressalta.
Guimarães afirma que o governo federal deve realizar ações educativas para incentivar a população a procurar unidades de saúde e completar a cobertura vacinal.
De acordo com o pesquisador, as campanhas devem servir para que “a gente tenha a oferta das vacinas nas unidades de saúde e que a população faça a busca por essas vacinas — ao mesmo tempo que a gente possa fazer a busca ativa daqueles que ainda resistem ou que não têm a oportunidade de ir até uma unidade tomar suas doses”.
Comunicação com o governo federal
Na próxima quinta-feira (26/5), os secretários estaduais de saúde pretendem apresentar ao Ministério da Saúde dados sobre a Covid e cobrar ações para alavancar as coberturas vacinais. O debate será realizado durante reunião da CIT.
“Nosso maior desafio está na vacinação, que alcançou um patamar de estagnação de altíssimo risco. A população vinculou a vacinação a um tratamento alopático, e não compreendeu que a vacina é um instrumento de controle e prevenção para evitar que novas ondas ocorram”, explicou Nésio, presidente do Conass.
Para o gestor, a revogação da Espin cria uma falsa sensação de que o perigo da Covid já passou. “A ausência de uma coordenação nacional para toda a vacinação e criação da tese de uma vitória [contra o vírus] só prejudica a nossa capacidade de mobilização para a vacinação. O país precisa retomar, imediatamente, o ritmo de cobertura vacinal”, alerta Nésio.
O que diz o Ministério da Saúde?
O Metrópoles procurou o Ministério da Saúde para questionar quais ações de apoio aos estados e municípios foram adotadas durante a transição para o fim da emergência sanitária. A pasta, no entanto, não deu retorno até a publicação deste texto. O espaço segue aberto.
Quem declara o fim da pandemia?
Embora alguns países tenham derrubado as restrições de prevenção à Covid-19 e até mesmo removido a situação de emergência, a Organização Mundial da Saúde (OMS) é o órgão responsável por determinar o fim da emergência de saúde pública.
Em entrevista ao Metrópoles, o pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) Julio Croda, à frente de importantes pesquisas sobre o cenário epidemiológico da Covid-19 e a resposta às vacinas, explicou as atribuições nesse caso.
“Só a OMS determina o fim da pandemia, um evento de impacto global. Ela tem a prerrogativa de entender que caiu para endemia. Um país, isoladamente, não pode decretar o fim da pandemia”, disse Croda.
No mês passado, membros do Comitê de Emergência do Regulamento Sanitário Internacional da OMS, responsável por avaliar o cenário da pandemia, concluíram que ainda não é o momento de rebaixar a classificação da Covid-19. A decisão foi anunciada em 13 de abril.
Fonte: Metrópoles