Chama-se Vingadores: Guerra Infinita, mas poderia muito bem ser Thanos: Guerra Infinita. Os dez anos de Universo Cinematográfico da Marvel – nome dado à coesão dos filmes do estúdio desde a estreia de Homem de Ferro, em 2008 –, prepararam para a chegada do titã espacial e para, em doses homeopáticas, explicar o que são as joias do infinito, as pedras que capturam a essência da existência (poder, tempo, mente, espaço, realidade e alma) e a importância delas que, se juntas, podem detonar a galáxia inteirinha.
É como se os 19 filmes lançados pelo estúdio até aqui, histórias individuais desses heróis, fosse um grande e intenso prólogo. A história, toda, de fato, girava em torno desse sujeito, interpretado por Josh Brolin e sua obsessão por dizimar metade dos seres vivos de todos os planetas, com a reunião das tais joias.
E cada um dos filmes da Marvel estabeleceu algum ponto a ser abordado ali, em Guerra Infinita, seja na introdução de alguns dos muitos protagonistas do terceiro filme que leva o nome do grupo de heróis Vingadores, seja para apresentar pontos do universo (planetas, populações, etc).
Tudo levava até aqui, quando a nave de Thanos, bem furioso por esperar que seus enviados recuperassem as pedras super poderosas, ataca a nave com os sobreviventes da destruição de Asgard, vista em Thor: Ragnarok, filme lançado no ano passado.
A Marvel carrega consigo, nos cinemas, a questão de ser “engraçadinha demais”, “concurso de stand-up de heróis” e por aí vai. Humor está em Guerra Infinita, porque esses personagens criados ao longo dessa década são assim – e quem não era, caso de Thor (Chris Hemsworth), em seus primeiros filmes, passou a ser. É a tal fórmula do estúdio, que, como as bilheterias astronômicas mostram, tem resultado imediato – ao menos, a Marvel encontrou um tom, já a DC, rival nos quadrinhos e agora nos cinemas, tampouco sabe como quer que seus filmes “soem”, se épicos, se sérios, se densos e por aí vai.
De volta a Vingadores: Guerra Infinita, a história de um padrão cai por terra logo na primeira cena, do ataque à espaçonave de Thor. Há tiradas, momentos cômicos, mas o longa dirigido pelos irmãos Anthony e Joe Russo não se deixa perder pelo humor.
É tenso, é claustrofóbico, é angustiante. Vingadores: Guerra Infinita mostra a insignificância de alguns personagens diante de seres tão poderosos quanto os Filhos de Thanos, quatro cavaleiros que são os principais generais do exército do titã. Homem-Aranha de Tom Holland, novamente é ótimo, mas sofre porque seus poderes não lhe garantem tanta vantagem quando o inimigo é um brutamontes ou um ser com poderes telecinéticos.
É, afinal, um filme sobre Thanos, o mais associável vilão criado pela Marvel nos cinemas – mais até que Loki, o queridinho dos fãs, vivido por ?Tom Hiddleston. Thanos é um sujeito com uma missão. A qual ele acredita fielmente, para a qual ele sacrifica a si mesmo. Thanos não quer o bem para si, não quer governar. Quer um futuro para para todos, diante da ideia louca de que, para que isso aconteça, seja necessário dizimar trilhões de pessoas. Sonha com o fim das guerras, com assistir ao nascer do sol no topo de uma montanha. É insano, o “titã louco”, como dito nos quadrinhos.
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Acontece que, por mais que tenha essa penca de personagens, Vingadores: Guerra Infinitaé capaz de criar uma narrativa em camadas – alguns personagens têm arcos longos, outros, menores, mas nenhum sai do filme como entrou. Thor é tão importante quanto Tony Star/Homem de Ferro (Robert Downey Jr.) e seu desenvolvimento, contudo, é menor do que o que vemos com Peter Quill/Senhor das Estrelas (Chris Pratt).
Os irmãos Russo são sagazes em acertar o tom, algo que Joss Whedon foi incapaz de fazer com Vingadores: Era de Ultron, o segundo filme da “linha Vingadores”. A questão não deve ser tentar abraçar o mundo, aquele mundaréu de personagem, e sim, tentar desenvolver uma trama que faça sentido. Ultron, o vilão, tinha tudo para ser trágico, tal qual Thanos, mas seu desenvolvimento é pífio, sua causa, descartável, sua lembraça, inexistente.
A resposta da fórmula acertada, afinal, está nos quadrinhos. Esses grandes eventos, que unem heróis de todas as revistas, ganham volumes próprios, enquanto o desenvolvimento maior dos personagens segue nos respectivos quadrinhos. Vingadores: Guerra Infinita é um filme-evento, algo de grandiosidade até então não mostrada nos filmes da Marvel, com consequências ainda mais pesadas do que o primeiro Vingadores, aquele de 2012.
Isso, é claro, aliado a algumas tiradinhas cômicas e ação de tirar o fôlego. A câmera dos Russo é versátil, vai do grandioso e colorido espaço ao real e urbano. Transforma-se de acordo com os núcleos dos personagens – sim, é preciso dividir os heróis em sub-grupos, ou nada feito.
Vingadores: Guerra Infinita é um filme sobre o amor em tempos de guerra. Amores entre casais, amores fraternos, amores paternos. É sobre despedidas e frases não ditas. Sobre arrependimentos e mágoas. No sub-texto esbalecido entre as grandes explosões, sofre-se por equivocos no passado. Teme-se o futuro, qualquer que seja. O presente é amargo como um beijo de despedida em um aeroporto. Nada será como antes depois disso.
Citado no início do texto, o título “Thanos: Guerra Infinita” colocaria o foco no lugar certo. Thanos é a estrela e o coração que faz pulsar o filme. Quando a lágrima deixada escorrer no rosto de um vilão comove, algo mágico acontece. Empatia, até mesmo diante do mais terrível e cruel dos inimigos. Se isso não é uma lição para todos os outros filmes de super-heróis, não sei o que mais pode ser.