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O juiz Carlos José Rondon Luz, da 20ª Zona Eleitoral de Várzea Grande, manteve a sentença que cassou o mandato da prefeita de Várzea Grande, Lucimar Campos (DEM), de seu vice José Hazama (PRTB), e do vereador eleito Benedito Francisco Curvo, o "Chico Curvo".
A decisão foi dada nesta terça-feira (10) e negou recurso da defesa da prefeita, que alegou omissão, contradição e obscuridade na cassação.
O magistrado cassou o mandato dos três no dia 2 de outubro, pela acusação de abuso de poder político e compra de votos. Todos ainda foram declarados inelegíveis pelo prazo de oito anos, a contar da eleição de 2016.
Apesar das decisões desfavoráveis, eles só perderão os cargos se a sentença for confirmada no Tribunal Regional Eleitoral de Mato Grosso (TRE-MT).
No pedido ao magistrado, a defesa de Lucimar afirmou que a sentença conteve vícios; julgou além do que foi pedido; desrespeitou o contraditório e a ampla defesa; e usou expressões ofensivas contra os alvos da ação.
Sem omissão
Já o juiz Carlos Luz negou as irregularidades, afirmando que sua decisão foi fundamentada “com base nos elementos constantes dos autos e a controvérsia devidamente solucionada”.
“Verifica-se que ficaram consignados expressamente os tópicos que os embargantes alegam haver omissão, contradições e/ou erro material, conforme se vê de uma leitura atenta e não apressada do decisum, para onde se remete os embargantes, tendo, assim, a r. sentença atendido estritamente aos preceitos contidos no artigo 489 do novo Código de Processo Civil, debatendo os temas postos à discussão, ainda que contrariamente aos interesses dos Réus/Embargantes e por prisma diverso, já que o juiz tem independência funcional e analisa a lide pela ótica que entender pertinente”, disse.
O magistrado explicou que o tipo de recurso interposto na ação (embargos) não permite que se reanalise as provas produzidas para modificar a sentença. “assim como responder a indagações das partes sobre pontos controvertidos já dirimidos na decisão embargada ou escolher e ditar as palavras que o juiz deve ou não utilizar para solucionar a controvérsia submetida à sua análise”.
“Em relação ao suposto caráter extra petita da sentença, deve-se registrar que tanto a parte dispositiva como a fundamentação da sentença invectivada observou fielmente o que dispõe o artigo 492 do novo CPC , analisando os fatos explicitados na petição inicial, sobre os quais recaíram as provas produzidas ao longo do processo, deles extraindo as consequências jurídicas pertinentes, quais sejam, a aplicação de multa, cassação dos diplomas e declaração de inelegibilidade, na forma expressamente prevista nos artigos 22, inciso XIV, da LC nº 64/90 c/c artigo 41-A da Lei nº 9.504/97, fixando de forma certa e clara a responsabilidade conjunta dos réus pelos ilícitos eleitorais perpetrados”.
Carlos Luz negou que tenha impedido o acesso ao contraditório e à ampla defesa e ressaltou que permitiu “a produção de provas documentais e oral em audiências, sem falar nas substanciosas contestações apresentadas no curso do processo”.
“Não foi por outra razão que contra os Embargantes, ao contrário do que eles equivocadamente buscam fazer crer, com fiel observância aos princípios do contraditório e da ampla defesa, foram aplicadas as respectivas sanções legais previstas não só na Lei das Eleições como na LC nº 64/90 (artigo 22), de forma que inexiste, portanto, qualquer erro material e/ou de fato, assim como omissões, contradições e/ou obscuridades, a serem sanados por meio de embargos de declaração”.
De igual maneira, o juiz também rejeitou a tese de que usou termos depreciativos em relação aos alvos da ação.
“Não há que se falar em ofensa ao artigo 78 do NCPC , pois não há na r. sentença embargada qualquer expressão ou intuito ofensivo ou depreciativo às partes tampouco a seus causídicos. Ao reverso, na referida sentença houve tratamento adequado da matéria posta ao crivo judicial, porém, conforme lhe compete no momento da análise exauriente dos feitos, fazendo-se o juízo de valor crítico em relação ao tema posto à análise judicial, aquilatando-se e confrontando-se os argumentos utilizados pelas partes com o fito de obterem o convencimento do juiz, como ocorre normalmente em qualquer processo”, decidiu.
A cassação
O processo em questão, que resultou na segunda cassação de Lucimar, atendeu a um pedido formulado pela coligação “Mudança com Segurança”, encabeçada pelo candidato derrotado a prefeito, Pery Taborelli (PSC).
Na representação que motivou a cassação, a coligação de Taborelli apontou que, em uma reunião realizado no dia 13 de setembro de 2016, o presidente do Departamento de Água e Esgoto de Várzea Grande, Eduardo Abelaira Vizotto, e o vereador Chico Curvo “protagonizaram o uso promocional do serviço de abastecimento de água e captação ilícita de sufrágio, em comunidade visivelmente carente”, visando beneficiar a candidatura de Lucimar e Hazama.
Segundo a coligação, na reunião, estariam presentes cerca de 50 pessoas para as quais teriam sidos oferecidos abastecimento de água, perfuração de poço e envio de caminhão-pipa, em troca de votos a favor de Lucimar, José Hazama e Chico Curvo.
A reunião foi, inclusive, gravada por um dos presentes no local e usada como prova documental no processo.
Para a coligação, o episódio configura abuso de poder político, pois os réus utilizaram-se da máquina pública em proveito próprio e captação ilícita de sufrágio. Ainda segundo eles, a reunião teria afetado a igualdade de oportunidades entre os candidatos na eleição de 2016.
Ao analisar as provas, o juiz entendeu que a conduta configura a captação ilícita de sufrágio – independentemente de terem sido eles ou não os efetivos idealizadores da "reunião".
"As mídias juntadas pela autora e periciadas pela PF provam que os Réus prometeram mesmo aos eleitores do bairro Portal do Amazonas os serviços acima citados, tudo com o fito de obter especificamente o voto dos moradores daquele bairro presentes na ocasião, fazendo nítida barganha de serviços públicos essenciais (água, pavimentação asfáltica etc.) mediante a interferência direta dos Réus Eduardo Vizotto e Chico Curvo", disse Rondon.
Ainda segundo o juiz, ao contrário do que alegaram os réus, o episódio não foi somente um ato típico de campanha tampouco "simples promessas de conteúdo político genérico".
Para ele, ficou claro que as promessas foram feitas aos eleitores como verdadeira moeda de troca ou de favores.
"Ocorreu pedidos expressos de votos aos presentes na 'reunião', mediante explícita promessa de oferta de caminhões pipas, perfurações de poços artesianos, além da pavimentação asfáltica na comunidade, numa evidente, ilícita e espúria barganha de votos em troca de vantagens pessoais ofertadas especificamente aos eleitores presentes na ocasião", disse o magistrado, em trecho da decisão.
"Embora seja certo que para a caracterização da captação ilícita de sufrágios não seja indispensável a existência de pedido explícito de votos, no presente caso, houve vários pedidos explícitos de votos aos moradores/eleitores presentes, o que demonstra a robustez das provas existentes nos autos e a utilização da 'despretensiosa' reunião política com fins verdadeiramente escusos, de clara captação ilícita dos incautos e pobres eleitores ali presentes, desguarnecidos de serviços sociais básicos e essenciais, como água e asfalto, portanto em evidente situação de vulnerabilidade e natural e completa dependência e ansiedade pela efetivação das promessas feitas pelo réu", afirmou o juiz.