Que o agronegócio sustenta a economia brasileira, muita gente sabe. O que muitos desconhecem é o árduo caminho percorrido pelos produtores rurais para chegar ao patamar de protagonistas da economia nacional. Em meio a muitos gargalos – desde a dificuldade para acesso ao crédito, lentos processos de regularização fundiária, entraves ambientais e até embargos comerciais – este setor não desiste e seus números surpreendem a cada ano.
Levantamento do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), da Esalq/USP, mostra uma evolução na participação do agronegócio no Produto Interno Bruto (PIB) nos últimos anos. Passou de 18,7% em 2014 para 26,6% em 2020, percentual que considera todo o segmento e as evoluções de volume e dos preços reais.
Apesar do crescimento expressivo, a performance não é permanente. Considerado uma indústria a céu aberto, o agronegócio sofre fortemente os impactos de intempéries climáticas e os revezes do mercado, como a cotação do dólar, barreiras comerciais às exportações, aumento nos custos de produção, entre outros fatores. Sem contar o elevado endividamento dos produtores, que investem bilhões para plantar.
E se o setor não sofreu o impacto da pandemia em 2020, em 2021 a história foi diferente. Culturas como milho, cana-de-açúcar, algodão e café tiveram a produtividade comprometida por fatores climáticos. Num país continental, não é raro alguns estados sofrerem estiagem e outros excesso de água. O resultado foi a queda no PIB do setor nos 2° e 3° bimestres do ano passado. Só no 3° bimestre, a retração foi de 8%, considerada a maior desde o início da série histórica do IBGE.
A redução na produtividade e consequentemente na produção no último ano – que não atingiu a sojicultura -, e o aumento nos custos para produção colocam o produtor em uma situação delicada. Isso porque, devido à pandemia, muitos empresários rurais aproveitaram a oportunidade dada pelas instituições financeiras e adiaram o pagamento de financiamentos. Agora, em 2022 e 2023, as parcelas começam a vencer e diante dos problemas na safra e o custo maior para produzir, a conta não fecha.
Para se ter uma ideia, levantamento do Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária (Imea), divulgado em janeiro, aponta aumento de 42% no custo de produção da soja em 2022 na comparação com 2021. O valor desembolsado para produzir um hectare passou de R$ 4.357,16 para R$ 6.208,11, desconsiderando custo de oportunidade de terra, capital circulante, máquinas, implementos e benfeitorias. E o vilão desta conta são os fertilizantes, cuja despesa dobrou de valor, ao passar de R$ 1.141,09 para R$ 2.274,01/hectare.
Aliado a isso, os produtores enfrentam outra situação: a falta de produtos para dessecação no mercado. Desde que a Anvisa baniu o uso de comercialização do Paraquat, em setembro de 2020, os produtores foram obrigados a buscar outros herbicidas no mercado e a indústria não conseguiu atender a demanda. Falta de produto no mercado resulta em inflação nos preços, e mais pressão nos custos de produção.
Essa disparada no custo levou a Associação dos Produtores de Soja e Milho de Mato Grosso (Aprosoja) a protocolar, no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) e na Procuradoria-Geral da República (PGR), um documento solicitando providências em relação ao cancelamento de pedidos e alta expressiva nos preços dos defensivos.
Com este cenário, uma nova crise ronda o agronegócio, com forte tendência de aumento no número de pedidos de recuperação judicial, alternativa ao produtor rural para se restabelecer e proteger o negócio diante de uma crise financeira.
Segundo dados da Serasa Experian, 2021 fechou com 891 pedidos de recuperação judicial (considerando todos os segmentos empresariais, e diferentes portes), uma queda 24,4% sobre os 1.179 requerimentos registrados em 2020. Foram sete anos seguidos em que a quantidade de pedidos passou da casa de mil. O resultado de 2021 ficou próximo ao registrado em 2014, quando foram 828 solicitações à Justiça para recuperação judicial.
Com uma perspectiva financeira desfavorável, o pedido de socorro judicial é um caminho possível ao produtor rural. Com as mudanças ocorridas na Lei de Recuperação Judicial (11.101/2005), que vai desde a possibilidade de recuperação judicial da pessoa física do produtor rural até a dispensa da Assembleia Geral de Credores, por meio do Termo de Adesão Coletivo Majoritário, denominado “TACOM”, é possível ter processos mais céleres e exitosos.
A ferramenta está aí e deve ser usada pelo bem dos negócios, dos empregos gerados pela atividade e pelas divisas que geram para o País.
Allison Sousa é advogado, sócio da ERS Advocacia
Fonte: Gazeta Digital