O conflito entre a Rússia e Ucrânia completa 100 dias nesta sexta-feira, 3, e o saldo deixado é devastador, não só para os ucranianos que já registraram, de acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU), mais de 10 milhões de refugiados, contabilizando os que deixaram o país e aqueles que estão deslocados internamente, mais de três mil mortos e cerca de US$ 600 bilhões em prejuízo, como para o restante do mundo, que se vê em um cenário de escassez alimentar, altas nos preços de combustível e petróleo e desordem global. Apesar de os últimos dias terem sido mais frios no confronto, especialistas alertam que não se pode acostumar com esse cenário e que nos próximos dias já devemos voltar a ter uma nova escalada da guerra, que já está em seu quarto mês e mostra uma Rússia atolada no pior erro geopolítico cometido pelo governo de Vladimir Putin.
Entretanto, apesar dessas serem as consequências que “saltam aos olhos”, Consentino diz que existem outros fatores que não vão ser solucionados, como: os refugiados, a economia e a desordem da geopolítica global. “A invasão da Ucrânia pela Rússia não é apenas sobre a Europa, mas abala a ordem internacional”, disse recentemente o primeiro-ministro japonês, Fumio Kishida, cujo governo se associou às sanções ocidentais contra Moscou, particularmente financeiras. Todo esse confronto mexeu com as relações diplomáticas, e dois países se tornaram protagonistas: a China, que está sendo ambígua na guerra, e a Turquia, que ganhou destaque por se dar bem tanto com Putin como com Volodymyr Zelensky, e ser a peça chave para decidir se vai permitir o ingresso de Suécia e Finlândia na Otan ou não. Além disso, Consentino aponta que em breve ela terá que decidir entre se “aliar à Rússia e à autocracia ou ao ocidente, como vinha fazendo”.
Para Lucena, a guerra na Ucrânia é um dos “maiores erros geopolíticos do governo de Vladimir Putin”. Em cem dias, eles conquistaram 20% do território ucraniano, e as regiões controladas pelas tropas russas são “basicamente a região do Donbass até o sul da Ucrânia”, o que os aproxima da fronteira com a Moldávia, que também tem uma região separatista pró-Rússia. “Esse é o plano B. Ele não conseguiu dominar todo o Leste Europeu militarmente, então está tentando dominar as regiões com predominância russa”, pontua Lucena. Depois que retirou suas tropas da capital ucraniana no final de março, quando aconteceu a última reunião de negociação de paz, Putin informou que concentraria suas forças no leste do país. Atualmente, as tropas estão focando em Severodonetsk e Lyssychansk, os últimos redutos de Zelensky em Luhansk.
“O conflito armado deve continuar até o final do ano ou o próximo, porque não há interesse de nenhuma das partes em ceder”, explica o doutor em relações internacionais, acrescentando que “Putin não vai acabar com a guerra e o que podemos ver nos próximos meses é de fato uma invasão da Transnístria”, uma região separatista pró-Rússia que fica na Moldávia. Diante desses fatos, Lucena aponta que, diferente do que era dito em fevereiro, quando a “operação militar” foi lançada, “as forças russas não são tão evoluídas do ponto de vista militar quanto se imaginava”.
Na quinta-feira, 2, o presidente ucraniano afirmou que os russos ocupam “quase 20% do território ucraniano”. A porcentagem equivale a 125 mil quilômetros quadrados, que incluem a anexada península da Crimeia e o território controlado por separatistas pró-Moscou desde 2014. Apesar de parecer pouco para tanto tempo de conflito, Consentino ressalta a importância de analisar com cautela quando se fala nesse assunto, porque “se pensarmos na violação da soberania, é muito”, agora, “se imaginarmos o tamanho do poderio russo, um quinto em cem dias indica que eles não são tudo o que diziam”. Essa é a mesma linha de raciocínio para quando pensamos se há alguém com vantagem na guerra. Os especialistas falam que do ponto de vista bélico, é nítido que a Rússia é melhor, porém, com o constante auxílio que Ucrânia tem recebido dos países ocidentais, ela “se torna capaz de articular uma resistência importante”, diz Consentino.
Lucena aponta que a Rússia “não imaginava que seria alvo de tantas sanções conjuntas e que teria retaliação das empresas estrangeiras”, o que basicamente “tira o capitalismo ocidental do país” e, consequentemente, mexe com a economia e “gera o empobrecimento do país e da população, porque tira os russos de uma cadeia universal de valor e das relações internacionais de comércio”. Por isso, quando pensamos no ponto de vista econômico, por causa do apoio internacional e diplomático, “que também é importante neste momento”, afirma Lucena, a Ucrânia sai na frente.
Fonte: Jovem Pan