Pedradas na Lei Rouanet

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Reprodução
CAMARA VG

Muito se tem falado nos últimos dias sobre a Lei de Incentivo a Cultura e de polpudos cachês pagos por paupérrimos municípios a afortunados artistas, principalmente cantores sejam eles da modinha ou não.

O furdunço ganhou visibilidade a partir da fala do cantor Zé Neto durante show realizado na cidade de Sorriso, em Mato Grosso, onde o famoso criticou a lei Rouanet dizendo que os sertanejos são pagos com o dinheiro do “povo” e para apimentar, disparou contra sua colega de profissão, a cantora Anitta, afirmando que para ele (o cantor) ser famoso não precisaria tatuar o “fiofó”.

É legal um pequeno município encravado no extremo norte do país, cuja população é de pouco mais de oito mil habitantes, pagar 800 mil reais a um artista para se apresentar por duas horas? Pode até ser. Porém, é de uma imoralidade dantesca.

Estamos falando de somente um show do cantor sertanejo Gusttavo Lima durante apresentação na exposição agropecuária na cidade de São Luiz, em Roraima.

Ocorre que o “buraco” é mais embaixo, porque durante três dias de evento outros artistas se apresentarão na pacata cidade e o município distante 300 quilômetros da capital, Boa Vista, desembolsará, segundo o Ministério Público do Estado de Roraima, mais de três milhões de reais em cachês para outros artistas.

Esse valor representa quase 10% da arrecadação total do município durante o ano de 2021, que foi de 33 milhões de reais. Se a festa acontecer alguns são-luisense ficarão felizes e terão muita história para contar.

Já outros, que serão a maioria, por algum motivo não poderão participar da festança e certamente não terão a mesma felicidade daqueles, quando precisarem, por exemplo, de assistência educacional e a saúde. E por falar em educação, o atual prefeito da cidade roraimense, um maranhense, de 36 anos é professor do ensino fundamental.

Foi a partir da fala desastrosa do cantor que faz dupla com Cristiano, que a Justiça e o Ministério Público abriram procedimentos para apurar dezenas de contratações de shows Brasil a fora.

Falamos de Roraima e do cantor Gusttavo Lima, que até agora está sendo um dos mais “prejudicados”. Mas há também casos de contratações milionárias de diversos artistas em outros Estados.

Na cidade de Conceição do Mato Dentro, em Minas Gerais, o mesmo cantor foi contratado por 1,2 milhão de reais, que somados a contratação de outros artistas atingiu a cifra de quase 2,5 milhões de reais.

Em Magé, no Rio de Janeiro, o mesmo Gusttavo Lima foi contratado pela bagatela de 1 milhão de reais e a justiça abriu inquérito para apurar a gastança no show em comemoração ao aniversário da cidade.

Aqui cabe um parêntese para dizer que, notadamente Gusttavo Lima está no olho do furacão porque é o apoiador mais famoso do atual Presidente da República.

Para os desinformados a fala do cantor Zé Neto ao criticar a lei Rouanet soa bem aos ouvidos. Ocorre que assim como ele, outros sertanejos tais como o próprio Gusttavo Lima, Zé Di Camargo, Bruno, Rick, Naiara Azevedo e Sérgio Reis são apoiadores ferrenhos do atual mandatário do País que também não é adepto da pobre lei.

Cabe destacar, que a lei foi criada com o objetivo de popularizar os direitos culturais e o livre acesso às fontes de cultura com a promoção e valorização das expressões culturais nacionais, em especial para o artista anônimo.

E para que isso fosse concretizado, o grande destaque da lei Rouanet é a política de incentivos fiscais que possibilita empresas e cidadãos aplicarem uma parte do imposto de renda devido em ações culturais.

Pelo visto o cantor Zé Neto não é conhecedor dessa lei. Porque se fosse ele saberia que dificilmente shows, inclusive o dele, poderiam ser bancados com o incentivo da lei criada por Sérgio Paulo Rouanet (geralmente ocorre processo licitatório).

Dado que, após alterações promovidas pelo atual Governo com o pretexto de expandir o setor cultural para atrair mais investimentos a lei passou a ter novos limites para pagamentos de apresentação de artistas.

E convenhamos! Os limites são minguados, basta dar uma olhadinha no artigo 17, da Instrução Normativa SECULT/MTUR nº 01/2022.

A verdade é uma só. Em razão da polarização política-ideológica que estamos vivendo, também no meio artístico, os simpatizantes de fulano sobem ao palco para criticar a lei e a cantora que notadamente é simpatizante de beltrano.

Diante disso, dúvidas pairam no ar e fico me perguntando: i) o por que famosos sertanejos usam esse ou aquele grupo político para se posicionarem; e ii) o por que esse ou aquele grupo político usam os artistas para ficarem bem na foto diante da plateia que assistiu shows de “grátis”.

Quem ganha de quem nessa história? Ambos, inclusive com os bolsos transbordando. Mas que briguem pra lá e antes disso façam retratação pública em razão das falácias sobre a lei Rouanet que é um berço de esperança para inúmeros artistas anônimos do nosso País.

Claiton Cavalcante é contador.

Fonte: Midia News

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